A nossa casa está a arder. A profunda crise climática não desacelera e as ondas de choque do Covid-19 agravam os seus impactos, expondo as fragilidades do nosso sistema e deixando milhares à beira do desemprego, da precariedade e da pobreza. A solução da crise climática exige uma transição energética justa, que reconfigure os meios de produção baseados em fósseis, garantindo soberania energética e democracia produtiva e que crie empregos dignos, possibilitando emprego a centenas de milhares de pessoas em serviços públicos. No entanto, tanto para o nosso governo como para as grandes empresas, o lucro continua a sobrepôr-se ao nosso futuro. Perante isto, não podemos ficar de braços cruzados.
Por isso, respondemos ao apelo internacional para a realização de uma Mobilização Climática Global, no próximo dia 25 de Setembro. Em Portugal, queremos que este protesto una vários movimentos e várias vozes, pelo que voltaremos a sair às ruas enquanto Salvar o Clima. Queremos construir este processo com diferentes setores da sociedade civil, uns mais próximos destas lutas, outros em aproximação.
Face a uma crise climática, de saúde e da economia, os direitos básicos têm de ser garantidos a toda a população, de forma incondicional. No entanto, estes direitos estão ameaçados.
Cortar globalmente 50% das emissões de gases com efeito de estufa até 2030 será a maior transformação que a Humanidade já empreendeu, e é exatamente aquilo que a Ciência nos diz que tem de acontecer. Não o fazer é destruir as condições materiais que permitiram a civilização humana e é fechar os olhos ao agravamento da injustiça social climática que atinge sobretudo quem mais obstáculos enfrenta – mulheres, pessoas portadoras de deficiência, pessoas em condições socioeconómicas mais precárias e sem acesso a emprego e/ou salários dignos, habitação decente, alimentação e saúde, pessoas racializadas, pessoas discriminadas e excluídas devido à sexualidade, género, entre outros. Em simultâneo, os países que historicamente mais contribuíram para as emissões de gases com efeito de estufa – países do Norte Global – têm responsabilidade histórica e moral para com os países que são mais diretamente afetados pela crise climática – que vem agravar, muitas vezes, dificuldades já enfrentadas. Quem menos contribui para as alterações climáticas é quem mais sofre com as suas consequências.
Ao desafio global de realizar uma transição justa para a neutralidade carbónica até ao ano de 2030 acrescem os desafios nacionais e locais. É urgente:
– Garantir a requalificação profissional das pessoas trabalhadoras de setores poluentes, sem custos para as mesmas, começando pelas das centrais termoelétricas de Sines e do Pego, e tendo as pessoas trabalhadoras afetadas prioridade na colocação nos postos de trabalho que serão gerados no setor público aquando da transição energética;
– Criar um setor público que lidere o processo de produção de energia, uma produção abrangente para toda a população, a partir de fontes renováveis, nomeadamente solar e eólica, com investimento público e serviço público, desde a transformação de materiais até à instalação das turbinas e dos painéis;
– Revogar a legislação que permite o lançamento de novas concessões de petróleo e gás no país;
– Proibir a importação de gás natural obtido por fraturação hidráulica e travar qualquer expansão do sistema de receção, armazenamento e transportes de gás natural (incluindo o sistema de transporte por gasodutos previsto);
– Acabar com os contratos de exploração de lítio e outros minérios que apresentam impactos nocivos para os ecossistemas, nomeadamente a rede de água potável, e que não têm em conta as preocupações das populações locais e incumprem a meta de redução de emissões de CO2;
– Cancelar quaisquer grandes projetos que acarretem um garantido aumento de emissões de gases com efeito de estufa, nomeadamente expansões portuárias e aeroportuárias;
– Combater os moldes do sistema económico que incentivam o desperdício, através da produção e consumos excessivos, nomeadamente em fenómenos como a obsolescência programada, financiando projetos que incentivem a produção de produtos de longa duração, alternativos às atuais opções;
– Desmantelar as empresas petrolíferas portuguesas, que têm uma responsabilização direta na militarização das zonas indígenas e na expulsão das comunidades locais, representando uma continuação do colonialismo no Sul Global;
– Criar um plano habitacional em que a) o acesso à habitação seja garantido a toda a população independentemente do seu estatuto socioeconómico, b) haja um verdadeiro plano de eficiência energética e de descontaminação dos edifícios públicos e c) procure encontrar soluções alternativas para edifícios que possam vir a ser afetados pelas alterações climáticas;
– Assegurar um acesso equitativo à água potável e a alimentos, prevenindo uma verdadeira crise migratória, pela sua falta, nas próximas décadas;
– Conferir o caráter de gratuidade e requalificar a rede de transportes públicos nacionais, tanto através da sua expansão, quer nacional quer internacionalmente (criando possibilidades de descentralização de serviços), como através da sua eletrificação, plano que exigirá um investimento comprometido com este mesmo serviço;
- Criar um novo plano nacional florestal e agrícola fundamentado na agroecologia e permacultura, reduzindo a agricultura e pecuária intensivas, beneficiando a produção local e favorecendo um progressivo aumento da capacidade de auto-aprovisionamento alimentar em Portugal. Incentivar projetos benéficos às zonas rurais e adequar as áreas florestais nacionais às condições climáticas actuais e futuras, apostando na diversificação de espécies e na promoção de árvores autóctones, numa perspetiva de aumento de resiliência face a incêndios e diversificação de usos florestais nas áreas rurais;
– Tornar o estudo das alterações climáticas e ecologia parte do currículo obrigatório em todas as disciplinas de aprendizagem essencial, em todas as escolas.
Para concretizar estas exigências será necessário um nível de mobilização sem precedentes na sociedade mundial, incluindo na sociedade portuguesa.
As sociedades, os Estados e as pessoas terão de cooperar e empenhar-se neste processo histórico, global e nacional, territorial e ambiental, económico e social. A transição energética vai, simultaneamente, suprimir e gerar postos de trabalho. Uma verdadeira transição justa tem de pautar-se por princípios de equidade, de justiça social e laboral.
No dia 25 de Setembro paramos para avançar. Paramos porque não é possível continuar a fingir que será com pequenas reformas e esforços pouco ambiciosos que avançamos, mas sim com ações concretas e mudanças profundas, construídas socialmente para responder a um problema sem paralelo. Paramos porque não há tempo a perder. Paramos pela vida. Paramos pelas nossas vidas.
Dia 25 de Setembro, paras connosco?
Organizações subscritoras e apoiantes em atualização aqui.
Organizações podem enviar email para 25setembro [-at-] salvaroclima.pt para subscrever o manifesto ou para apoiar a mobilização. Para esta mobilização não estamos a aceitar subscrições e apoio de pessoas a título individual.